Governo altera decreto sobre Sistema Nacional de Defesa do Consumidor

Foi publicado, no último dia 7 de dezembro, o Decreto nº 10.887/2021, que trouxe relevantes alterações nas normas gerais de aplicação das sanções administrativas previstas no Código de Defesa do Consumidor.

Duas importantes mudanças se referem à aplicação de atenuantes e agravantes no momento do cálculo da sanção administrativa. Foram acrescidas três circunstâncias atenuantes (artigo 25): a confissão da infração; a participação do infrator em projetos de capacitação e treinamentos oferecidos pelos órgãos de defesa do consumidor e ter o fornecedor aderido à plataforma Consumidor.gov.

Em relação às circunstâncias agravantes, o novo Decreto prevê, em seu artigo 26, que para que qualquer órgão agrave uma sanção por considerar uma infração como prática de dano coletivo ou de caráter repetitivo, a infração deverá estar listada em banco de dados a ser mantido pela Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública (SENACON). Essa modificação, que se revela bastante benéfica e razoável, pois o que se vê na prática judicial e administrativa são diversos órgãos aplicando essa agravante sem a devida fundamentação, ou mediante adoção de critérios subjetivos, considerando apenas e tão somente a compreensão particular do fiscal ou do órgão julgador, o que trazia inequívoca insegurança jurídica

Do mesmo modo, a inclusão do artigo 26-A impede que órgãos de defesa do consumidor criem, por si só, circunstâncias agravantes que não estão previstas no Decreto.

Outra alteração extremamente relevante diz respeito à necessidade de observação, pelos órgãos administrativos, da proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção no momento da aplicação da pena (artigo 28), tese essa que é frequentemente suscitada em âmbito administrativo e que muitas vezes não é aceita por não estar prevista nas normas internas dos PROCONs, a despeito de sua natureza constitucional. Resta a se observar como os órgãos aplicarão esse dispositivo.

O novo Decreto ainda retira a possibilidade de instauração de processo administrativo com base, exclusivamente, em reclamação de consumidor (inciso III do artigo 33 da redação anterior), sendo necessário ato, por escrito, de autoridade competente ou lavratura de auto de infração.

Nesse sentido, foi incluído um capítulo próprio (artigos 33-A e 33-B) para regulamentar a chamada averiguação preliminar, que é o procedimento investigatório de natureza inquisitorial, instaurado pela autoridade competente de proteção e defesa do consumidor, quando os indícios ainda não forem suficientes para a instauração imediata de processo administrativo sancionador, como ocorre quando é apresentada mera reclamação por consumidores.

Essa alteração também se afigura benéfica, já que é uma praxe regular de alguns órgãos administrativos considerar a reclamação dos consumidores como provas suficientes de supostas infrações e, consequentemente, utilizá-las, de forma isolada, como fundamento para aplicação de altas penalidades.

O novo artigo 38-A do Decreto em questão traz, por sua vez, uma função orientadora da fiscalização e não meramente punitiva, quando a atividade econômica for classificada como de risco leve, irrelevante ou inexistente. Essa inclusão fortalece a alegação do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade na tentativa de minorar sanções, a despeito do engessamento da dosimetria das penas adotada pelos PROCONs.

O §1º desse artigo inova com a menção à dupla visita como requisito indispensável para lavratura do auto de infração (sob pena de nulidade), o que demandará mais diligências do órgão para confirmar a infração e, assim, viabilizar nova percepção sobre os fatos analisados.

Alteração igualmente relevante é aquela trazida no novo artigo 46 do Decreto 10.887/2021, que prevê, expressamente, que as decisões administrativas precisam estar devidamente fundamentadas e que devem preencher requisitos taxativos, o que poderá evitar a prolação de decisões totalmente genéricas e padronizadas.

Por outro lado, a alteração do dispositivo precisa ser avaliada com cautela, porque há agora previsão de imputação de multa diária para caso de continuidade de infração e/ou multa em caso de descumprimento das providências estipuladas, o que (apesar de ser legalmente questionável, ante a ausência de previsão desta sanção do Código de Defesa do Consumidor), pode acarretar em majoração de eventual penalidade já aplicada.

Há ainda, importante alteração do prazo de defesa previsto no artigo 42, o qual passa de 10 para 20 dias.

Por fim, a inclusão do artigo 65-A permite a aplicação subsidiária da Lei Federal nº 9.784/99 e do Código de Processo Civil, que abarca a prescrição intercorrente e que possui vários dispositivos cuja aplicação pode ser benéfica às empresas (contagem do prazo em dias úteis, por exemplo). Necessário avaliar, contudo, se essa inclusão será suficiente para alterar o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prescrição, por exemplo, deve estar prevista na legislação estadual.

A equipe do Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados permanecerá acompanhando a implementação do Decreto recém-publicado e suas repercussões.