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COP28: principais resultados e perspectivas

A Conferência das Partes (COP28), encerrada em 13 de dezembro, e reportada em documento final denominado de UEA Consensus, foi marcada por decisões e compromissos que têm o potencial de representar um ponto de virada significativo no combate às mudanças climáticas e, o que parece ser, o início do fim da era dos combustíveis fósseis. Ocorre, entretanto, que esta perspectiva dependerá do quanto tais compromissos serão efetivamente implementados.

Balanço Global – Global Stocktake

De forma histórica, após 28 anos de negociações internacionais sobre o clima, os Estados-partes concordaram em dimuir o uso de combustíveis fósseis. Esse compromisso faz parte da primeira “avaliação global” sobre como os países podem acelerar a implementação das metas do Acordo de Paris, o Global Stocktake ou Balanço Global.

Para contextualizar, o Balanço Global é uma avaliação compreensiva dos progressos realizados desde o Acordo de Paris de 2015. O balanço é um processo de dois anos programado para acontecer a cada cinco anos. O primeiro balanço global começou em

2022 e se encerrou agora  na COP28; o próximo deverá ocorrer em 2028 e assim por diante. O objetivo é coordenar esforços para acelerar e potencializar as ações voltadas ao combate da crise climática, incluindo a avaliação de medidas para endereçar lacunas identificadas.

Assim, o balanço global avalia as iniciativas e ações climáticas realizadas pelos Estados-partes desde a assinatura do Acordo de Paris e, com uma perspectiva para o futuro, estabelece estratégias para superar os obstáculos em direção à neutralidade carbônica. Nesse contexto, uma manifestação expressa quanto à necessidade de reduzir o uso dos combustíveis fósseis era fundamental.

Durante a COP28 foi, então, concluído o Primeiro Balanço Global, e sob intensa pressão diplomática dos Estados-partes e da sociedade civil, a versão definitiva do relatório, de maneira inédita, destacou explicitamente a necessidade de uma transição em um movimento de distanciamento (“transition away”) dos combustíveis fósseis.

Os rascunhos iniciais do balanço contemplavam uma opção para “eliminar completamente os combustíveis fósseis” ou “phase out”. No entanto, no dia 11 de dezembro, último dia da conferência, o rascunho do texto foi modificado para o termo menos ambiocioso “phasing down”, que determina apenas uma redução gradual.

A inclusão da expressão “phase out” tem sido objeto de disputa e uma exigência há anos da sociedade civil e alguns Estados-Membros, principalmente os em desenvolvimento e mais afetados pela crise climática.

A alteração menos ambiciosa provocou intensas discussões e críticas, resultando no atraso do encerramento da COP. Após um dia a mais de discussões, os Estados-Membros finalmente chegaram a um acordo e alteraram o texto final para a utilização da expressão “transition away from fossil fuels”.

A linguagem adotada nos documentos oficiais é essencial para se atingir a meta de limitação do aquecimento global a 1,5º, e a alternativa “transition away from” é mais ambiciosa em comparação à “phasing down”,  já que a primeira remete a uma transição  para encerrar o uso dos combustíveis fósseis ao contrário da segunda que delimita apenas uma redução gradual. A escolha final não foi tão ambiciosa quando o uso do termo “phase out”, mas representa  um avanço considerável por ser a primeira vez que o documento final de uma COP faz menção expressa aos combustívies fósseis. Mais que uma discussão da terminologia, a relevância da questão é a sinalização  que fica ao mercado e stakeholders em geral, em versão curta:  a era dos combustíveis fósseis como principal força motriz da economia global tem prazo limitado.

Compromissos Climáticos Nacionais – Nationally Determined Contributions (NDCs) 

Além da questão dos combustíveis fósseis, a parte final da decisão do balanço global forneceu orientações para todos os países desenvolverem seus próximos compromissos climáticos nacionais antes da COP30, programada para novembro de 2025 em Belém, Brasil. Os países foram incentivados a apresentar metas ambiciosas de redução de emissões alinhadas com a limitação do aquecimento global a 1,5ºC. Aqui, mais uma sútil mas relevante vitória. Já se falava em adotar o limite de 2ºC, ao invés dos atuais 1,5ºC. O acordo final, privilegiou assim, a meta original e mais rigorosa.

Perdas e  Danos – Loss and Damage

Em relação ao fundo de perdas e danos, em um movimento histórico, a operacionalização do fundo foi antecipada, marcando a primeira vez que um resultado substancial foi alcançado durante uma sessão de abertura da COP. Os Emirados Árabes Unidos lideraram ao contribuir com US$ 100 milhões, seguidos pela Alemanha, com também US$ 100 milhões, Itália e França somaram US$ 108 milhões. Estados Unidos, Japão, Dinamarca, Irlanda, Noruega, Canada, Reino Unido e União Europeia também fizeram seus compromissos, com o valor total chegando a US$ 700 milhões.

Apesar do avanço, os países em desenvolvimento expressaram desapontamento já que o valor total dos compromissos cobre uma fração mínima suas necessidades anuais para descarbonização da economia.

Vale lembrar que a discussão sobre as perdas e danos tem sido marcada por intenso debate e controvérsia e refere-se a uma questão de reparação histórica entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, decorrente da desiguladade entre benefício auferido por suas respectivas economias durante o período  ancorado na exploração de combustíveis fósseis.

Financiamento Climático

O financiamento climático continuou sendo uma questão controversa, com países em desenvolvimento argumentando a necessidade de recursos substanciais para implementar políticas sensíveis ao gênero e à adaptação climática. O plano de ação de gênero, lançado na COP25, sofreu reduções significativas no texto final, gerando críticas.

Transição Energética – Energy Transition

Como sinal importante para o desenvolvimento de energias renováveis, 118 governos se comprometeram a triplicar o investimento em energias renováveis e a dobrar o crescimento da eficiência energética até 2030. Foram  também anunciados diversos compromissos que indicam uma clara determinação em alcançar a meta de 1,5°C e a necessidade de priorizar o desenvolvimento de energias renováveis. Um exemplo foi o endosso de 39 países à Declaração de Intenções do Hidrogênio dos Emirados Árabes Unidos, uma norma global de certificação de hidrogênio fundamental para impulsionar o comércio internacional desse recurso.

Apesar do progresso nas intenções, estas ainda carecem de uma política clara de implementação, de modo a efetivar a transição energética, especialmente no que diz respeito ao financiamento necessário, a origem e forma de alocação deste.

Adaptação – Adaptation

Outra decisão importante na COP28 foi a criação de um “framework”, ou seja uma estrutra base, que se destina a orientar as nações nos seus esforços para proteger as suas populações e ecossistemas das alterações climáticas.

Com o fim do “programa de trabalho” de dois anos, criado na COP26, que visava impulsionar o Objetivo Global de Apatação (Global Goal on Adaptation – GGA), as partes foram incumbidas de criarem uma estrura base de ações que os países poderiam utilizar para orientar seus respectivos progressos em ação de Adaptação.

Um dos pontos trazidos pelo framework foram os “temas” que deveriam ser abrangidos na meta global de adaptação, sendo acordados: água, alimentação, saúde, ecossistemas, infra-estruturas, erradicação da pobreza e patrimônio cultural.

Mercado de Carbono – Carbon Market

Devido a falta de consenso sobre diversos aspectos da operacionalização do mercado de carbono, as negociações em torno do Artigo 6 do Acordo de Paris, que aborda o mercado carbono, pouco avançaram.

Compromissos Diversos

Além das negociações principais, a COP28 resultou em uma série de novos compromissos principalmente partindo da iniciativa privada, abrangendo desde a redução de emissões de empresas de petróleo e gás até o aumento das energias renováveis e melhorias nos sistemas alimentares.

E o Futuro?

Com uma perspectiva jurídica, o avanço da questão climática se traduz em avanço da regulação multilateral e doméstica acerca do tema. Ressalta-se assim que, apesar de o acordo firmado não representar efetiva obrigação jurídica e adotar uma linguagem sempre muito facultativa ao invés de uma determinativa, firma-se um compromisso implícito perante a comunidade internacional, com potenciais efeitos e impactos sobre os sistemas jurídicos domésticos e expõe governos e partes diversas ao escrutínio público.

Com um olhar voltado para o futuro, os próximos dois anos desempenharão um papel crucial no enfrentamento da crise climática. Com a COP29 a ser sediada no Azerbaijão e a COP30 em Belém do Pará, uma cidade amazônica, os governos precisarão acompanhar de perto a implementação dos compromissos firmados em Dubai, sendo crucial estabelecer novas metas de financiamento climático.

Na COP30, será imperativo que os Estados demonstrem, por meio de suas novas Contribuições Nacionalmente Determinadas, até que ponto estão realmente alinhados com a meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento a 1,5°C.

Assim, como sempre, a COP apresentou aspectos positivos e negativos, com países-membros, sociedade civil e setor privado avançando em direção à descarbonização da economia, embora sempre se termine com uma sensação de que muito mais poderia e deveria ter sido alcançado  para conter o agravamento da questão climática, respeitando-se o estágio de desenvolvimento de cada  país.