Como resultado da Consulta Pública (CP) nº 09/2024, a Diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou, na 7ª Reunião Pública Ordinária de 2025, realizada em 11 de março, a Resolução Normativa (REN) ANEEL nº 1.114/2025 que regulamenta o aprimoramento do cálculo da energia requerida e das Perdas Não Técnicas (PNT) nos sistemas de distribuição de energia elétrica. A norma já está em vigor.
Com a aprovação, a mudança no cálculo da energia requerida e das PNT será feito com base no mercado medido das distribuidoras — registrado nos relógios medidores, conforme o consumo de cada unidade consumidora — e não mais pelo mercado faturado, que é aquele cobrado nas faturas de energia, considerando aspectos comerciais como cobranças retroativas, créditos e custo de disponibilidade.
Nesse sentido, a aprovação incluiu alterações nos regulamentos vigentes (Submódulos 2.1, 2.6, 2.6A, 3.1, 3.2, 3.2A, 4.2, 4.2A e 4.3 dos Procedimentos de Regulação Tarifária – Proret) e nas planilhas dos processos tarifários, para incorporar o mercado de fornecimento medido e a energia injetada de MMGD, com vigência a partir dos processos tarifários de 2025, além da padronização das informações fornecidas no Sistema de Acompanhamento de Informação de Mercado para Regulação Econômica (SAMP Balanço), com a determinação de implementar o aprimoramento do cálculo para os processos tarifários já deste ano. Para as empresas que já concluíram a atualização do processo tarifário de 2025, o novo cálculo será aplicado a partir de 2026 de forma retroativa, excepcionalmente.
Veja, a seguir, detalhes do processo de aprovação da nova REN nº 1.114/2025:
- O que motivou a CP?
- A CP nº 09/2024 e o cenário quanto às contribuições recebidas.
- A deliberação na 7º RPO/2025
- O tratamento dado aos créditos de energia expirados ou compensados em até 60 meses
(i) O que motivou a CP?
A motivação para a instauração da CP nº 09/2024 decorre do crescimento da MMGD e da observação pelas áreas técnicas da Aneel de uma suposta vantagem na utilização do mercado medido, em vez do faturado, para calcular a compra de energia pelas distribuidoras.
Conforme voto da diretora relatora Agnes Maria de Aragão da Costa:
“25. Ocorre que ao longo dos últimos anos, em razão do crescimento do mercado de MMGD, ocorreu uma maior disparidade de montantes entre os mercados de baixa tensão faturado e medido, com impactos para a forma de apuração das perdas totais. (…) 27. Isso porque com a maior inserção de MMGD, o mercado medido passou a sofrer decréscimo pelo consumo simultâneo dos prossumidores, ao passo que o faturado passou a sofrer decréscimo não somente pelo consumo simultâneo como também da energia compensada dos prossumidores. Desse modo, a redução do mercado faturado se dá de forma mais acentuada que a redução do mercado medido com consequente descasamento temporal no cálculo do ajuste entre mercado medido e faturado e menor repasse de perdas não técnicas para as distribuidoras.”
(ii) A CP nº 09/2024 e o cenário quanto às contribuições recebidas.
A consulta pública foi instaurada originalmente para obter contribuições sobre o Relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR) nº 01/2024, que propôs alternativas para o cálculo da energia requerida e das PNT nos sistemas de distribuição de energia, considerando os efeitos da MMGD, além de sugestões para alterações no Proret e melhorias no SAMP Balanço.
Por meio da AIR nº 01/2024, foram apresentadas quatro alternativas para o cálculo da energia requerida e das PNT, que estão descritas a seguir.
- Alternativa 0: Mercado de baixa tensão (BT) medido ajustado;
- Alternativa 1: Homologação BT medido;
- Alternativa 2: BT faturado ajustado;
- Alternativa 3: Energia compensada (Geração Distribuída I – GDI) no cálculo da Diferença Medido Faturado (DMF).
Para cada uma dessas alternativas, constou no AIR nº 01/2024 uma análise com base em 5 critérios a fim de facilitar a comparação e a escolha dos agentes à época, que estão descritos a seguir:
- Consideração da MMGD no cálculo da energia requerida e das perdas não técnicas.
- Simplicidade e uso de dados consolidados
- Alocação dos custos
- Simplificação do cálculo das perdas não técnicas
- Estabilidade regulatória
A CP nº 9/2024 contou com 115 contribuições de 19 participantes, incluindo agentes do setor, associações e conselhos de consumidores. Aproximadamente 44,3% das contribuições foram integralmente aceitas pela Agência, enquanto 4,5% foram parcialmente acatadas.
Recebidas as contribuições, a maioria dos contribuintes preferiu a alternativa 1, que prevê a homologação das PNT sobre o mercado de baixa tensão medido e o cálculo da energia requerida pelo mercado medido, em vez do faturado. A área técnica acatou essa proposta, citando que ela reduz distorções associadas à Geração Distribuída de Energia (GDI), simplifica o envio de informações pelas distribuidoras, aumenta a precisão do cálculo, melhora a alocação do custo de disponibilidade e simplifica o cálculo das perdas não técnicas.
(iii) A deliberação na 7º RPO de 2025
Durante a deliberação do processo 48500.009318/2022-65 sobre resultado da CP nº 9/2024, houve três pedidos de sustentação oral.
Ricardo Brandão, representante da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), destacou como principal ponto de discussão as alternativas para o tratamento da energia requerida, com foco na neutralidade econômica dos créditos de MMGD para as distribuidoras. Ele ressaltou que a Aneel reconhece que a proposta antecipa créditos que supostamente expirarão, assumindo implicitamente que 100% dos créditos se esgotarão. Relembrou ainda que a Lei 14.300/2022 define o crédito como “empréstimo gratuito”, sem ônus para a distribuidora, e que a neutralidade dos créditos já é garantida pelo procedimento atual.
Por isso, levou como proposta ao colegiado os seguintes tópicos:
- Não antecipar os créditos expirados na CP, adiando o tratamento para quando a Aneel regulamentar a destinação dos créditos não utilizados após 60 meses.
- Incluir no voto uma menção à neutralidade dos efeitos para as distribuidoras, com a Superintendência de Fiscalização Econômica, Financeira e de Mercado (SFF) definindo procedimentos contábeis em prazo curto. A relatora votou no sentido de enviar recomendação para as áreas técnicas regulamentarem a questão, destacando que a previsão no voto “contempla as preocupações da Abradee”.
- No cálculo da energia requerida, usar o mercado medido, abatendo a energia compensada, para neutralizar os efeitos e simplificar o procedimento contábil.
Os três representantes, Ricardo Brandão, André Ramon Silva Martins (Neoenergia Distribuidora) e Hugo Lamin (Enel RJ), destacaram também a necessidade de retroagir os efeitos aos processos tarifários de 2023. Embora o problema tenha sido identificado em dezembro de 2022, nos processos tarifários de 2023, foi tratado apenas o componente de perdas técnicas.
André Ramon Silva Martins propôs a abertura de uma 2ª fase da CP para aprofundar as discussões sobre a aplicação da solução desde os processos de 2023 e a possibilidade de antecipar a reversão de saldo de créditos não compensados no período para o mercado, além de revisar o modelo de contabilização para neutralizar o impacto econômico para as distribuidoras. Hugo Lamin, por sua vez, também solicitou o reconhecimento dos impactos de forma retroativa a 2023 e 2024, alinhando-se à solicitação dos demais participantes.
Diante do exposto, a diretora relatora votou pela aprovação do aprimoramento do cálculo da energia requerida e das perdas não técnicas, considerando os efeitos da energia de MMGD, conforme a alternativa 1 constante no Relatório de AIR nº 01/2024. Além disso, votou por enviar uma determinação para as áreas técnicas analisarem o tratamento mais adequado para os créditos de energia expirados ou compensados em até 60 meses. O voto da relatora foi seguido integralmente pelos demais diretores, que aprovaram os resultados da CP nº 09/2024 por unanimidade.
(iv) O tratamento dado aos créditos de energia expirados ou compensados em até 60 meses
O voto da relatora deixou claro que “o aprimoramento metodológico objeto da CP nº 09/2024 trata exclusivamente do cálculo da cobertura tarifária relativa ao custo de compra de energia das distribuidoras e em nada interfere na relação comercial entre as distribuidoras e cada um dos prossumidores”, uma vez que essas últimas regras são regulamentadas pela Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021 (REN nº 1.000/2021) e a Lei nº 14.300/2022.
O posicionamento da relatora seguiu a orientação da área técnica, que, após estudo, entendeu que os créditos acumulados no âmbito do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) antes da vigência da nova REN nº 1.114/2025, em conformidade com o art. 655-L da REN nº 1.000/2021, dependem de regulamentação futura, nos termos do art. 2º da REN nº 1.000/2021 e art. 13 da Lei nº 14.300/2022.
Portanto, a relatora decidiu enviar uma determinação, separada do encerramento da CP nº 09/2024, para que a Superintendência de Fiscalização Econômica, Financeira e de Mercado (SFF) e a Superintendência de Gestão Tarifária e Regulação Econômica (STR) desenvolvam os aprimoramentos e atualizações regulatórias, no período de até 1 ano, para:
- definição do tratamento dos créditos de MMGD expirados antes da aprovação da nova REN nº 1.114/2025 e;
- definição do tratamento dos créditos sobre a energia injetada de MMGD em período anterior a nova REN nº 1.114/2025, que será objeto de compensação ou expiração futura, assim como os procedimentos contábeis necessários para tanto.
A equipe de Energia do Rolim Goulart Cardoso encontra-se à disposição para mais esclarecimentos e para auxiliá-los na discussão judicial do tema.