No último dia 8 de fevereiro, foi publicado, no Diário Oficial da União, o aviso de Consulta Pública (CP) nº 003/2024 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para o recebimento de contribuições sobre proposta da regulamentação do Programa Minha Casa, Minha Vida por meio da Resolução Normativa (REN) nº 1.000/2021, de aprimoramentos regulatórios à esta norma para tratar da inversão de fluxo de potência e de outros temas atinentes à micro e mini geração distribuída.
A Lei nº 14.620/2023, que instituiu o novo Programa Minha Casa, Minha Vida e revogou o Programa Casa Verde Amarela, trouxe mudanças importantes no setor elétrico, incluindo alterações no Marco Legal da Microgeração e Minigeração Distribuída (Lei nº 14.300/2022). Em virtude dessa nova legislação, após intensos debates no âmbito da Reunião Pública Ordinária, a Diretoria Colegiada da Aneel concluiu pela necessidade de aprimoramentos à REN nº 1.000/2021.
O primeiro aprimoramento proposto pela CP nº 003/2024 diz respeito à inserção de novo artigo relativo à implantação de infraestrutura de energia elétrica para conexão dos empreendimentos à rede de distribuição, que será responsabilidade da distribuidora e poderá ser subsidiada ou financiada com recursos do Programa. Nesse contexto, caso o empreendedor antecipe a execução das obras, terá direito a reembolso pela distribuidora, o qual não contemplará as obras relativas à infraestrutura interna do empreendimento, incluindo transformadores, que será de responsabilidade exclusiva do empreendedor.
A CP também contempla a alteração de dispositivo para fins de operacionalização do desconto mínimo de 50% no custo de disponibilidade para as unidades consumidoras participantes do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) inscritos no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
Além disso, foi conferida pela lei a possibilidade de comercialização de excedente de energia gerada pelos participantes do SCEE e beneficiários de programa social ou habitacional (federal, estadual, distrital ou municipal) com órgãos públicos. Nesse sentido, a CP propõe um novo dispositivo segundo o qual a energia comprada para a unidade consumidora do órgão público seja faturada de forma semelhante à energia compensada no SCEE.
A formalização dessa comercialização exige a celebração de contrato de compra de energia de geração distribuída entre a unidade consumidora do órgão público e a unidade consumidora com geração distribuída, tendo como parâmetro um percentual ou ordem de energia excedente que será alocada, além da formalização com a distribuidora para que esta operacionalize o faturamento e comprove o atendimento dos seguintes requisitos legais: (i) documento emitido por órgão competente que comprove que a unidade consumidora com geração distribuída é beneficiária de programa social ou habitacional; (ii) cópia do contrato de compra de energia de geração distribuída; e (iii) relação das unidades consumidoras que compraram a energia e o percentual ou ordem do excedente de energia que será alocado a cada uma delas.
Paralelamente, foi incluída na Consulta Pública o tema da inversão de fluxo de potência, que ocorre quando há geração distribuída que excede a capacidade do sistema elétrico e/ou a demanda do mercado, causando problemas técnicos como desbalanceamento de fases, elevação da tensão e danos aos transformadores. Caso tais problemas não sejam tratados ou evitados, podem inviabilizar a operação do sistema de proteção e a regulação de tensão, assim como aumentar as perdas técnicas, o que causa danos ao sistema de distribuição ou a outras instalações e equipamentos elétricos.
Esse debate técnico é crucial para o processo de conexão de micro e minigeradores à rede de distribuição na forma do art. 73, §1º da REN nº 1.000/2021, segundo o qual, em casos de nova conexão ou aumento da potência injetada pela central geradora, a distribuidora deverá realizar estudos para identificar as opções que eliminem a inversão do fluxo de potência no posto de transformação ou no disjuntor do alimentador.
A análise técnica indicou a necessidade de ajustes no texto regulatório para clarificar que, em conexões do Grupo B com transformador exclusivo da distribuidora, a análise de inversão do fluxo de potência deverá ser realizada apenas no nível de tensão superior. Além disso, propõe-se discutir na CP situações em que o art. 73, §1º não será aplicado, como para microgeração e minigeração distribuída que não injete energia na rede de distribuição e microgeração distribuída enquadrada nos critérios regulatórios de gratuidade, à luz dos arts. 104, 105 e 106 da REN nº 1.000/2021.
Por fim, adicionalmente, a CP visa aprimorar diversos outros dispositivos da REN nº 1.000/2021, como aqueles relativos (i) à análise em lote das Solicitações de Conexão; (ii) aos Orçamentos de Conexão incompletos, incorretos ou contrários à regulamentação; (iii) à aprovação do Orçamento de Conexão com ressalvas; (iv) aos requisitos para a solicitação de avaliação do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) em determinados casos; (v) à transferência de controle societário; (vi) à proporcionalização dos custos de conexão; (vii) à titularidade por associação de geração compartilhada; (viii) aos custos na cobrança de fatura em atraso; (ix) às regras de faturamento em unidades consumidoras faturadas na modalidade tarifária horária branca ou com benefício referente às atividades de irrigação e aquicultura; e (x) ao tratamento da diferença entre energia consumida e compensada.
A documentação referente à CP nº 003/2024 poderá ser consultada na página específica da Aneel.
Os interessados deverão encaminhar suas contribuições à Agência até 23 de fevereiro.
O time de Energia do Rolim Goulart Cardoso seguirá acompanhando as novidades da regulamentação do setor elétrico e fica à disposição para auxiliar com contribuições à CP e esclarecer eventuais dúvidas.